Fernando Haddad
José Serra
Estranha química a que se está constituindo para a eleição deste ano para a maior cidade da América Latina, o principal polo econômico do país, o terceiro maior orçamento da República. Claro que estou falando de São Paulo.
Os dois principais candidatos, salvo novas surpresas, serão um veterano político, José Serra, que quer ser presidente da República, não prefeito; e um jovem especialista em Educação, Fernando Haddad, que, embora pertença ao PT (Partido dos Trabalhadores), talvez o de mais forte democracia interna, acabou sendo beneficiado por um "dedazo", como se diria no México do velho PRI (Partido Revolucionário Institucional), praticado pelo ídolo Luiz Inácio Lula da Silva.
Esse cenário é reflexo da debilidade do sistema partidário brasileiro. Sorte dos brasileiros que a democracia continua saudável, graças a uma sociedade civil pujante, embora avessa a mobilizações de massa, e a uma estrutura econômica igualmente pujante e diversificada, que torna pouco viáveis aventuras autoritárias.
A debilidade do sistema partidário começa pelo número excessivo de siglas: 29 estão legalizadas, 23 estão representadas na Câmara dos Deputados. Alguém aí acredita que possa haver, em qualquer país, 29 ou mesmo 23 propostas diferentes de organizar a vida econômica e social, que seria a principal tarefa dos partidos?
O número excessivo vem acompanhado de escassez programática e ideológica. Basta lembrar que o partido de criação mais recente, o PSD (Partido Social Democrata), foi inventado pelo atual prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, acompanhado da seguinte definição: não é de direita nem de esquerda nem de centro.
Coerente com essa definição (ou, mais exatamente, indefinição), Kassab é capaz de aliar-se com os dois partidos que são os adversários históricos na República, o PT e o PSDB (aliás, PSDB é também social-democrata, como o de Kassab). Ofereceu-se ao PT para fornecer o vice na chapa comandada por Haddad, mas recuou quando José Serra decidiu-se afinal pela candidatura, ao final de mais uma novela.
Afinal, Kassab foi inventado por Serra, como candidato a vice-prefeito na eleição de 2004, e contemplado com a Prefeitura, quando Serra a abandonou dois anos depois para disputar o governo do Estado, que acabou conquistando.
O PSDB aliás parece partido de um só candidato ou, no máximo, dois. Cada vez que há uma eleição para a Presidência da República, para o governo do Estado de São Paulo ou para a Prefeitura da capital, o candidato ou é Serra ou é Geraldo Alckmin, hoje governador.
Tanto PSDB como PT fogem de primárias, prévias ou qualquer sistema de disputa interna comum nos Estados Unidos e em alguns países europeus. O PSDB até marcou uma prévia, entre quatro candidatos, para o domingo, 4 de março. Mas bastou que Serra anunciasse sua disposição de concorrer de novo à Prefeitura para que dois deles abandonassem a disputa.
É compreensível: Serra lidera a pesquisa de intenção de voto, com 21%, enquanto os quatro outros nomes do partido nem chegam a 10% cada um.
Já o PT preferiu desprezar o favoritismo (e as prévias): quem liderava as pesquisas, no ano passado, era a senadora Marta Suplicy, que também havia sido prefeita. Mas aí veio Lula, praticou o "dedazo" e o candidato virou um virgem em disputas eleitorais, o ministro da Educação de Lula e de Dilma Rousseff, Fernando Haddad (4% na pesquisa mais recente do instituto Datafolha, sétimo colocado entre 10 potenciais candidatos).
Tudo leva a crer que Lula acredita poder reeditar com Haddad o que fez com Dilma Rousseff, também virgem em disputas eleitorais mas que, não obstante, elegeu-se presidente com base no prestígio de seu padrinho.
Tudo somado, tem-se que o cenário na principal eleição brasileira de 2012 gira, claramente, em torno de personalidades (Serra, Lula, Haddad, eventualmente Dilma) e não de partidos.