
O ministro Guido Mantega, o presidente da Câmara Marco Maia e Dilma.
A presidente Dilma Rousseff anunciou na terça-feira um conjunto de medidas para estimular a economia. Houve muitas críticas, algumas delas até eventualmente corretas do ponto de vista técnico.
Mas a única acusação que seria injusta é a da falta de coerência.Explico: a presidente tem sistematicamente lamentado o tratamento que a Europa está dando à crise, adotando apenas medidas de ajuste, sem se preocupar com o essencial que é o crescimento econômico.
Logo, para ser coerente, Dilma não poderia ficar de braços cruzados, assistindo passivamente a desaceleração da economia brasileira.É óbvio que o problema no Brasil não tem um décimo da gravidade alcançada na Europa ou mesmo nos Estados Unido.
Os países europeus ou estão estagnados ou em recessão, ao passo que o Brasil continua crescendo, embora menos do que no luminoso ano de 2010, em que o crescimento superou os 7% - e, diga-se, foi um dos fatores que ajudou a eleger Dilma naquele ano.Além disso, enquanto o desemprego aumenta ou se mantém muito elevado na Europa,
no Brasil há quase, quase, o pleno emprego.
Mesmo assim, a presidente está fazendo uma aposta no aumento do investimento, tanto público como privado, única maneira de assegurar um crescimento sustentável no futuro próximo.
A intenção do governo é levar a taxa de investimento dos atuais 19% do PIB para algo próximo de 25%, se possível em seu período de governo, que vai até 2014.
Como o PIB brasileiro é de cerca de US$ 2,5 trilhões, o programa anunciado significará um
esforço para investir algo em torno de US$ 150 bilhões, em prazo que a presidente não especificou.É um número significativo para uma economia ainda emergente.Outra intenção da presidente coincide com a grande queixa do empresariado e dos mortais comuns:
reformar o sistema tributário, uma enorme confusão, além de representar uma carga considerada excessiva.Do meu ponto de vista, não é que a carga seja de fato excessiva.
O problema é que os serviços públicos entregues como contrapartida dos tributos é que são ruins ou ausentes."Tenho plena consciência de que o Brasil precisa reduzir sua carga tributária", disse a presidente, em uma entrevista na Índia, na qual antecipou partes do programa anunciado na terça-feira.
Mas a reforma tributária será lenta e pontual porque, segundo ela, só no futuro, “talvez seja possível encaminhar uma reforma global”, em vista “dos vários interesses envolvidos na questão”. Citou como o principal deles a distribuição da arrecadação entre União, Estados e municípios". Por isso, Dilma defende uma discussão “calma, tranquila e realista”, enquanto toma “medidas pontuais que, no conjunto, permitem que se crie uma desoneração maior, o que é fundamental para o país crescer”.
Outro aspecto em que a presidente trafega na contramão do rigor fiscal europeu é na sua análise dos gastos do governo, duramente decepados na Europa.No Brasil, diz Dilma, gastos de consumo do governo, que obviamente não são investimento, terão que aumentar em alguns setores,
“principalmente quando se trata da saúde e da educação”.Para Dilma, é preciso, por exemplo,
ampliar o número de médicos, porque o Brasil tem uma das menores taxas de médicos por habitante (1,8 para cada mil brasileiros).A presidente diz que “a população reclama de duas coisas, falta de médicos e, portanto, de falta de atendimento. Não é investimento, mas
vamos ter que gastar e ao mesmo tempo aumentar a taxa de investimento”.

Imagino que esse bom senso, pelo menos do meu ponto de vista, esteja por trás da popularidade de Dilma:
a mais recente pesquisa lhe dá 77% de aprovação, quatro pontos acima do nível atingido no mesmo período de 2011. É um resultado igual ao melhor momento de Luiz Inácio Lula da Silva, supostamente campeão de popularidade de todos os tempos.O problema é que o governo Dilma tem aprovação bem menor (56%) do que a da pessoa Dilma.
Dá para traduzir assim: o que a presidente pretende e/ou diz merece mais aplausos do que o seu governo é efetivamente capaz de realizar.